RC 30305/2024
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02/10/2024 04:00

RESPOSTA À CONSULTA TRIBUTÁRIA 30305/2024, de 30 de setembro de 2024.

Publicada no Diário Eletrônico em 01/10/2024

Ementa

ITCMD – Transmissão causa mortis de quotas societárias – Base de cálculo.

I. Para efeitos de cálculo do ITCMD, o valor a ser atribuído às quotas sociais de empresas deve refletir o seu valor de mercado.

II. Admite-se o valor patrimonial, desde que se leve em conta o valor patrimonial real, ou seja, aquele que mais se aproxima do valor de mercado (valor com que as referidas quotas de patrimônio seriam passíveis de ser negociadas no mercado - preço de venda).

Relato

1. O Consulente, pessoa natural, relata que é sócio de uma empresa cujo contrato social prevê que, em caso de falecimento de qualquer dos sócios, a sociedade se dissolverá em relação a ele, ocasionando a redução do capital social subscrito.

2. Reproduz trechos do referido contrato, indicando (i) que no caso de falecimento de algum sócio “(…) caberá à empresa o início imediato do pagamento relativo às quotas sociais devidas mensalmente, a ele ou a quem de direito conforme estabelecido nos parágrafos abaixo”; e (ii) regras sobre a avaliação patrimonial da sociedade, bem como ao pagamento relativo às quotas sociais a quem de direito (herdeiros/sucessores).

3. Diante do exposto, indaga:

3.1. se a liquidação automática da sociedade, na hipótese em questão, configura fato gerador do ITCMD;

3.2. nesse caso, se o valor da base de cálculo do imposto será o valor das quotas sociais calculadas com base no patrimônio líquido ou deverá ser considerado outro valor, já que existe a possibilidade da realização de acordo que poderia resultar em valor pago inferior ou superior ao valor patrimonial.

Interpretação

4. Inicialmente, convém ressaltar que a exposição da matéria de fato e de direito objeto de dúvida, de forma clara e completa, bem como a citação do correspondente dispositivo da legislação que suscitou a dúvida, são requisitos para a formulação da consulta (artigo 513, II, “a” e “c”, do RICMS/2000 c/c com o artigo 31-A da Lei 10.705/2000). Considerando que não foram incluídas na consulta informações sobre quem seriam o autor da herança e os herdeiros, tampouco a identificação da sociedade empresária cujas quotas serão transmitidas, nesta resposta há somente considerações gerais sobre as questões de direito trazidas pelo Consulente sem se prestar a validar quaisquer fatos no âmbito de uma situação concreta.

5. Ainda em sede preliminar, recorda-se que as hipóteses de incidência do ITCMD estão previstas nos artigos 2º, 3ºe 4º da Lei 10.705/2000, consistindo, em síntese, na transmissão de qualquer bem ou direito havido por sucessão legítima ou testamentária, inclusive a sucessão provisória, e por doação.

6. Nesse sentido, observa-se que, na situação em análise, as quotas sociais da empresa compõem o patrimônio transmitido pelo de cujus, o qual está sujeito à incidência do ITCMD em decorrência da transmissão causa mortis.

7. Isso posto, observa-se que, como regra geral, a base de cálculo do ITCMD é o valor de mercado do bem ou direito transmitido na data da abertura da sucessão ou da realização do ato ou contrato de doação (artigo 9º, caput e § 1º). Contudo, o artigo 14 da Lei 10.705/2000 estabelece que:

“Artigo 14 - No caso de bem móvel ou direito não abrangido pelo disposto nos artigos 9º, 10 e 13, a base de cálculo é o valor corrente de mercado do bem, título, crédito ou direito, na data da transmissão ou do ato translativo.

§ 1º - À falta do valor de que trata este artigo, admitir-se-á o que for declarado pelo interessado, ressalvada a revisão do lançamento pela autoridade competente, nos termos do artigo 11.

§ 2º - O valor das ações representativas do capital de sociedades é determinado segundo a sua cotação média alcançada na Bolsa de Valores, na data da transmissão, ou na imediatamente anterior, quando não houver pregão ou quando a mesma não tiver sido negociada naquele dia, regredindo-se, se for o caso, até o máximo de 180 (cento e oitenta) dias. (Redação dada ao parágrafo pela Lei 10.992, de 21-12-2001; DOE 22-12-2001; Efeitos a partir de 01-01-2002)

§ 3º - Nos casos em que a ação, quota, participação ou qualquer título representativo do capital social não for objeto de negociação ou não tiver sido negociado nos últimos 180 (cento e oitenta) dias, admitir-se-á o respectivo valor patrimonial. (Redação dada ao parágrafo pela Lei 10.992, de 21-12-2001; DOE 22-12-2001; Efeitos a partir de 01-01-2002)”.

8. Da análise desse dispositivo, depreende-se que, mesmo aplicando-se o artigo 14, o valor das quotas transmitidas, para apuração da base de cálculo, seria o mesmo do considerado no artigo 9º - o seu valor corrente de mercado - ou seja, a regra geral da base de cálculo do ITCMD.

8.1. Isso porque, de acordo com o caput do referido artigo 14, deve-se levar em conta para a apuração da base de cálculo dos bens móveis e direitos por ele abrangidos o valor corrente de mercado do bem, título, crédito ou direito, na data da transmissão ou do ato translativo. Os parágrafos 1º e 3º desse artigo admitem, e não impõem, modos diferentes para a apuração desse valor corrente de mercado – o valor que for declarado pelo interessado (§ 1º) ou o valor patrimonial (§ 3º).

8.2. Assim, mesmo aplicando-se o artigo 14 ao presente caso, as quotas a serem transmitidas deverão, a priori, ser avaliadas conforme seu valor de mercado. Afinal, o que pretendeu o legislador foi aproximar o máximo possível a base de cálculo do valor de mercado do bem ou direito transmitido, apenas admitindo outros critérios na dificuldade de se encontrar tal valor. Forçoso reconhecer, portanto, que o § 3º contém mera possibilidade, cuja adoção dependeria do consenso entre o Fisco e o contribuinte.

9. Nesse sentido, andou bem o legislador ao usar a expressão “admitir-se-á” no § 3º do artigo 14, tendo em vista a dificuldade na apuração do valor de mercado de quotas representativas do capital social de sociedades por quotas de responsabilidade limitada.

10. É importante ressaltar, também, a multiplicidade de variáveis envolvidas no cálculo de uma participação societária – cotação no mercado, expectativas de rentabilidade, relação custo/benefício, cenário econômico, análise setorial, entre outras. Ademais, a noção de valor patrimonial não se restringe à análise do patrimônio líquido da empresa. Como se não bastasse a infinidade de elementos necessários para se atribuir valor às participações societárias, o próprio elemento “valor patrimonial” não é conceito único, se dividindo em valor patrimonial contábil e valor patrimonial real. Nesse sentido, Fábio Ulhoa Coelho ensina:

“Podem-se considerar duas modalidades de valor patrimonial: o contábil e o real. Nas duas, o divisor é o número de ações emitidas pela companhia, variando o dividendo. O valor patrimonial contábil tem por dividendo o patrimônio líquido constantes das demonstrações financeiras ordinárias da sociedade anônima, quer dizer, aquelas que ela está obrigada a levantar ao término do exercício. O instrumento que, especificamente, contém a informação é o balanço. A medida do patrimônio líquido ostentada pelo balanço ordinário, contudo, não raras vezes, encontra-se defasada. O valor em reais atribuído a cada bem ou direito do ativo, bem assim a exata e atualizada mensuração do passivo podem não retratar, de forma adequada, a situação real do patrimônio da sociedade, ou seja, pode ser que, no mercado, os bens do patrimônio social, se fossem postos à venda, alcançassem preços diferentes, menores ou maiores, dos valores referidos na demonstração contábil. Dois são, basicamente, os motivos da defasagem: em primeiro lugar, com o passar do tempo, tende a oscilar o valor dos bens da sociedade, e nem sempre a oscilação é devidamente reavaliada e apropriada; em segundo, os critérios para classificar ou quantificar determinado fato contábil são, em parte, discutíveis. Desse modo, os dados constantes das demonstrações financeiras podem acabar tornando-se infiéis à realidade da companhia. O instrumento contábil perde, como se costuma dizer, a sua consistência, justificando-se a reavaliação dos ativos e a conferência dos lançamentos, com vistas à elaboração de novo balanço patrimonial. Trata-se de balanço de ‘determinação’, cujo objetivo é possibilitar o cálculo do valor patrimonial ‘real’ da ação” (Curso de direito comercial, v. 2 – São Paulo: Saraiva, 1999, p. 85-86).

11. Em consonância com esse raciocínio, o valor patrimonial mencionado no § 3º só pode ser o valor patrimonial real, que é o que mais se aproxima do valor de mercado.

12. Nesse sentido, concluímos que, para efeitos de cálculo do ITCMD, o valor a ser atribuído às quotas deve refletir o seu valor de mercado (conforme os artigos 9º e 14, caput), podendo ser admitido o valor patrimonial desde que se leve em conta o valor patrimonial real, ou seja, aquele que mais se aproxima do valor de mercado (valor com que referidas quotas de patrimônio seriam passíveis de ser negociadas no mercado – preço de venda), mesmo nos casos em que o valor do patrimônio líquido seja menor que o valor do capital social da empresa.

13. Cabe registrar, ainda, que à Fazenda estará sempre reservado o direito de não concordar “com o valor declarado ou atribuído ao bem ou direito” e buscar, pelos meios que lhe são próprios, o correto valor de mercado do bem ou direito transmitido (artigo 14, § 1º, c/c artigo 11, ambos da Lei 10.705/2000).

14. Por fim, cumpre alertar que, em se tratando de falecimento do sócio da empresa, não há que se falar em doação por parte da sociedade ou dos herdeiros. Entretanto, somente diante do caso concreto seria possível verificar se alguma das partes abriu mão de seu direito ou de parte dele de forma graciosa, situação que, em regra, enseja a ocorrência do fato gerador do ITCMD.

15. Com esses esclarecimentos, consideram-se sanadas as dúvidas do Consulente.

A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.

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