RC 20993/2019
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07/05/2022 20:55

RESPOSTA À CONSULTA TRIBUTÁRIA 20993/2019, de 12 de fevereiro de 2020.

Disponibilizado no site da SEFAZ em 13/02/2020

Ementa

ICMS – Operação de circulação de mercadoria – Fornecimento de materiais de uso e consumo precedida de atividade imaterial de serviço logístico – Incidência.

I. As operações relativas à circulação de mercadorias (e, portanto, sob a égide do ICMS) são fundamentalmente aquelas que, circunscritas num contexto empresarial, impulsionam a mercadoria da fonte produtora ao consumidor final.

II. Tais operações implicam, via de regra, em uma obrigação de dar (a mercadoria), concomitantemente ou não com uma obrigação de fazer, sem que isso altere a natureza da operação.

III. Uma atividade essencialmente comercial, ainda que precedida de uma atividade imaterial de serviço logístico, não pode ser considerada como uma prestação de serviço.

Relato

1. A Consulente, cuja atividade principal registrada no Cadastro de Contribuintes do Estado de São Paulo – CADESP – é o comércio varejista de artigos de papelaria (CNAE 47.61-0/03), informa que realiza, em síntese, a revenda de diversas mercadorias (submetidas ou não ao regime de substituição tributária) e participa regularmente de licitações de órgãos públicos localizados neste ou em outros Estados, todos com o objeto de fornecimento de materiais de expedientes e suprimentos de informática para consumo.

 

2. Todavia, menciona que, nos últimos meses, vem sendo convidada a participar de uma nova modalidade de licitação, denominada de “Almoxarifado Virtual in Company”, regulamentada pela Instrução Normativa nº 8/2018, da Secretaria de Gestão do Governo Federal.

 

3. Acrescenta que, com base nos editais publicados pelo órgão público federal licitante, neste novo modelo, os materiais de escritório, de copa e cozinha, de conservação, limpeza, equipamento de proteção individual e outros, devem ser adquiridos por meio de prestação de serviço. Menciona que o modelo operacional e o objeto da contratação descritos nestes editais não são de operações mercantis (de compra de venda de mercadorias) como se espera que ocorram nas aquisições de materiais (mercadorias), mas tão-somente de prestação de serviço sujeita à incidência do ISSQN.

 

4. Informa ainda que o enquadramento da operação como prestação de serviço está baseado no Parecer Jurídico 00559 publicado na Nota Técnica 14037/2018 do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão (trecho transcrito na consulta), segundo o qual o fornecedor contratado, embora forneça materiais (“obrigação de dar”), realizará, ao final, várias operações internas de recebimento, armazenamento, logística, separação e distribuição (“obrigações de fazer”), dos quais, correspondem à maior parcela dos custos totais das aquisições. Assim, o objeto central revelaria maior parcela em um “fazer” (recebimento, armazenamento, logística, separação e distribuição) ao passo que o “dar” (aquisição do material) é item de menor relevância e não corresponde à maior parcela dos custos totais, ainda de acordo com a referida nota técnica. Assim, as operações do “Almoxarifado Virtual in Company” são enquadradas como prestação de serviço (hipótese de incidência do ISSQN, de competência do Município), e o fornecedor contratado deverá, ao final, conforme previsto em contrato (edital), emitir Nota Fiscal de prestação de serviço sob a totalidade dos materiais entregues.

 

5. Entende que, apesar do mencionado acima, o fornecimento dos materiais de expedientes e suprimentos a órgãos públicos (licitantes), ainda que na modalidade de “Almoxarifado Virtual In Company”, é operação de caráter mercantil. Logo, sujeita-se tão somente à incidência do ICMS (operações relativa à circulação de mercadoria), sendo evidente que a Consulente está obrigada a vender mercadorias, que se traduz numa obrigação de dar e não na prestação de um serviço (obrigação de fazer).

 

6. Ainda afirma que todo fornecimento de mercadoria (obrigação de dar - entrega da mercadoria) envolve algum tipo de serviço (obrigação de fazer - recebimento, armazenamento, logística, separação e distribuição) para o cliente - órgão público licitante -, mas são atividades-meio para derradeira atividade-fim que é vender mercadorias. No caso do “Almoxarifado Virtual In Company”, as etapas internas da Consulente, seja de recebimento, armazenamento, logística, separação e distribuição, são todos processos preparatórios (atividades-meios) para a atividade principal que é uma operação mercantil. Essas etapas internas só existem para viabilizar a operação-fim de vender mercadoria.

 

7. Reitera que, em razão da logística operacional inerente ao comércio, não se pode decompor em itens específicos da lista de serviços anexa à lei complementar federal 116/2003 (11.04 – Armazenamento, depósito, carga, descarga, arrumação e guarda de bens de qualquer espécie) nas várias etapas (ações-meios) que integram uma operação de venda de mercadoria, para pretender tributá-las separadamente, isoladamente, como se cada uma delas correspondesse a um serviço alvo da tributação do ISSQN (previsto em lista, prestados a terceiros como fim ou objeto) como pretende tributar a nova modalidade de licitação, denominada de “Almoxarifado Virtual in Company”.

 

8. Por fim, indaga:

 

8.1. Está correto o entendimento da Consulente em configurar as operações de fornecimento (venda) de materiais no modelo descrito acima, denominado de “Almoxarifado Virtual in Company”, como fato gerador exclusivamente do ICMS?

 

8.2. Em caso afirmativo, considerando o modus operandi descrito nos referidos editais (contrato), poderá a Consulente emitir Notas Fiscais de Remessas com o destaque do ICMS, para acompanhar o transporte da mercadoria até o destino e, posteriormente, emitir Nota Fiscal consolidada que se destina ao simples faturamento da venda sem o destaque do imposto, apenas para efeito de cobrança dos materiais entregues?

 

8.3. Todavia, em caso negativo quanto ao entendimento da Consulente, considerando, conforme Parecer Jurídico mencionado, que, no objeto de contratação (licitação) na modalidade de “Almoxarifado Virtual in Company”, os serviços logísticos internos correspondem à maior parcela dos custos totais das aquisições e revelam uma obrigação de fazer, as operações de fornecimento de materiais estariam sujeitas à hipótese de incidência exclusivamente do ISSQN?

 

8.4. Na hipótese de incidência exclusiva do ISSQN, considerando o modus operandi descrito nos editais (contrato), poderá a Consulente emitir Notas Fiscais de Remessas para acompanhar o transporte das mercadorias até os usuários ao abrigo da não incidência do ICMS nos termos do artigo 7º, inciso VIII, do RICMS/2000?

 

8.5. E, por fim, em tese, caso haja previsão contratual (edital) para os destaques do ICMS (entrega de mercadoria) e do ISSQN (serviços logísticos), considerando a realidade econômica de cada etapa no processo, poderá a Consulente emitir Notas Fiscais de Remessas com o destaque do ICMS para acompanhar o transporte da mercadoria até o destino e, posteriormente, emitir Nota Fiscal de Prestação de Serviço para cobrança?

 

9. Anexa, ainda, à consulta o documento “Termo de Referência”, o qual indica as especificações do negócio e o modelo operacional do “Almoxarifado Virtual”.

 

Interpretação

10. Preliminarmente, observa-se que, conquanto a Consulente relacione a dúvida apresentada com licitações promovidas por órgãos públicos federais – indicando inclusive o ato normativo regulatório correspondente (Instrução Normativa nº 8/2018, da Secretaria de Gestão do Governo Federal) –, o termo anexado à presente consulta se refere a procedimento licitatório realizado por pessoa jurídica de direito privado integrante do “Sistema S”. Sendo assim, esclarecemos que a presente resposta ater-se-á à análise da situação fática relatada, sem adentrar nas especificidades do termo anexado.

 

11. Feita essa consideração, é necessário esclarecer que a obrigação tributária principal surge com a ocorrência do fato gerador, sendo esse a situação definida em lei como necessária e suficiente à sua ocorrência, e que o titular da competência para se exigir seu cumprimento é o sujeito ativo (pessoa jurídica de direito público) dessa obrigação (artigo 113 c/c artigo 114 c/c artigo 119 do Código Tributário Nacional). Nesse sentido, a obrigação tributária surge com a subsunção do fato concreto à norma abstrata, cabendo ao respectivo ente público a competência para exigi-lo.

 

12. Portanto, é irrelevante para fins de determinação do fato gerador do imposto qualquer cláusula disposta no edital de contratação do serviço, a ser realizado pela Consulente, na qual se defina a incidência do imposto ou a forma de tributação. Com efeito, dentro do sistema constitucional de repartição de competências tributárias, o órgão federal contratante não está autorizado a solucionar, por meio da edição de ato infralegal, eventual conflito de competência entre entes tributantes distintos, no caso, Estados e Municípios. A hipótese de incidência tributária aplicável ao objeto do edital por ela contratado deve ser estabelecida, portanto, à luz do sistema constitucional tributário e da legislação própria para tal – no caso, as Leis Complementares 87/1996 e 116/2003.

 
13. Isso posto, diga-se que, independentemente da operação ser ou não de venda ou revenda, o ICMS incide sobre todas as operações relativas à circulação de mercadorias (artigo 1º, LC 87/1996).

 

14. Nesse sentido, salienta-se que este órgão consultivo tem expedido o entendimento de que, sob a repartição constitucional da tributação sobre o consumo, em função da etapa do ciclo econômico em que se encontra (industrial – União; comercial – Estados; e prestação de serviços – Municípios), as operações relativas à circulação de mercadorias (e, portanto, sob a égide do ICMS) são fundamentalmente aquelas que, circunscritas num contexto empresarial, impulsionam a mercadoria da fonte produtora ao consumidor final.

 

15. Tais operações implicam, via de regra, uma obrigação de dar (a mercadoria), concomitantemente ou não, com uma obrigação de fazer, sem que isso altere a natureza da operação, havendo, inclusive, a possibilidade de incidência de ICMS sobre o fornecimento isolado de uma atividade imaterial, desde que envolta em alguma etapa da cadeia do ciclo de produção e comercialização da mercadoria, ressalta-se.

 

16. Dessa feita, o fato de determinada atividade constar na Lista de Serviços anexa à Lei Complementar 116/2003, como prestação de serviço sujeita ao ISSQN, por si só, não inviabiliza que essa atividade seja, de fato e de direito, apenas uma etapa do ciclo de produção e comercialização da mercadoria e, dessa forma, estar sob a incidência do ICMS (artigo 2º, inciso III, alínea “a”, do RICMS/2000).

 

17. Negar essa constatação e tributar pelo ISSQN a realização de uma atividade envolta no ciclo produtivo, mesmo que imaterial, é ofender a não cumulatividade, já que o imposto pago sobre o serviço seria agregado ao custo de produção e de comercialização subsequentes, onerando a operação, sem a possibilidade de compensação e, portanto, em nítido descompasso com o objetivo constitucional.

 

18. Ademais, como mencionado acima, a Constituição Federal dispôs que compete aos Estados a tributação sobre as operações relativas à circulação de mercadorias (artigo 155, inciso II) e aos Municípios, a tributação sobre os serviços de qualquer natureza, não compreendidos no artigo 155, inciso II, e definidos em lei complementar (artigo 156, inciso III). Logo, dois requisitos mínimos são exigidos para que se considere determinada prestação de serviço abrangida pela competência municipal: (i) o serviço não pode estar compreendido no campo de incidência do imposto estadual; e (ii) o serviço deve estar previsto em lei complementar.

 

19. Sendo assim, a lista anexa à Lei Complementar 116/2003 deve ser interpretada à luz da Constituição Federal, uma vez que, por óbvio, a legislação infraconstitucional não pode contrariar as disposições constitucionais. Desse modo, uma atividade essencialmente comercial, ainda que precedida de uma atividade imaterial, não pode ser considerada como uma prestação de serviço (ISSQN). Considerar uma atividade econômica essencialmente comercial como inserida no campo de competência municipal representaria um desvirtuamento do próprio texto constitucional, que expressamente insere a circulação de mercadoria no campo de competência estadual (ICMS).

 

20. Feitas essas explanações teóricas, observa-se que a atividade objeto da licitação em tela não só se insere em uma etapa dentro do ciclo de comercialização da mercadoria (ICMS), auxiliando a impulsioná-la da fonte produtora ao consumidor final, como também agrega valor a ela, fornecendo, em conjunto, uma atividade imaterial (logística de aquisição e distribuição das mercadorias).

 

21. Com efeito, no modelo negocial em anáise, ao revender as mercadorias aos seus clientes, a Consulente (ou o eventual vencedor do procedimento licitatório) realiza, sem margem a dúvida, a circulação de mercadorias. E, no intuito de fornecer uma melhor atividade de gerenciamento de estoque (denominado, nos termos da IN 8/2018, “outsourcing”), uma solução tecnológica é agregada à atividade de revenda da mercadoria, inserindo-se, assim, por completo no ciclo de comercialização da mercadoria e, consequentemente, atraindo a integral tributação da atividade pelo ICMS.

 

22. Nesse sentido, conforme relato da Consulente, mostra-se claro que o órgão público licitante não pretende contratar simplesmente um serviço logístico, mas sim adquirir os produtos que serão utilizados para seu uso e consumo. Tanto assim que, nos termos relatados pela Consulente, o valor pactuado está atrelado à quantidade de produtos entregues, conforme indicado no trecho final do item 4 supra da presente resposta, em que se afirma que a Nota Fiscal é emitida sob a totalidade dos materiais entregues.

 

23. Resta ainda esclarecer que, mesmo que para fins privados as partes tenham total liberdade para fixar os termos contratuais que lhes convier, esses termos não repercutem necessária e automaticamente na esfera tributária. Dessa feita, ainda que as partes tenham acordado de modo diverso (ex.: revenda cumulada com prestação de serviços), os tributos não incidem, ipsis litteris, sobre o contrato tal como acordado (mera qualificação jurídica dada pelas partes), mas, sim, sobre a materialidade do fato econômico subjacente ao contrato e efetivamente praticado. E o ICMS, como visto, incide sobre a circulação de mercadorias, tendo o legislador eleito como critério quantitativo da incidência do tributo o valor da operação. Portanto, no caso em tela, tendo sido parte em uma operação de circulação de mercadoria (adquirente), não pode o órgão público, por meio de ato infralegal impróprio para tal, alterar seus critérios de tributação.

 

24. Sendo assim, ante todo o exposto, conclui-se que no caso em tela há a incidência do ICMS sobre a operação de revenda pretendida e as demais importâncias cobradas a título de serviço logístico.

 

24.1. Desse modo, não há uma revenda cujo valor da operação seria igual ao de aquisição acrescida de uma prestação de serviço dela desconexa. Do oposto, há uma revenda com agregação de valor à mercadoria. E, sendo assim, não há como cindir a base de cálculo, subdividindo o valor da operação em valor de revenda da mercadoria e eventual valor de uma atividade imaterial praticada em função dessa revenda.

 

24.2. Ademais, com relação às mercadorias sujeitas à substituição tributária, em regra, estas devem ser adquiridas com o imposto da operação subsequente (operação própria da Consulente) retido, tendo em vista que haverá operação de revenda posterior para o órgão público federal adquirente.

 

25. Por fim, quanto à emissão de Nota Fiscal, vale elucidar que, nos termos do artigo 204 do RICMS/2000, “é vedada a emissão de documento fiscal que não corresponda a uma efetiva saída ou entrada de mercadoria ou a uma efetiva prestação de serviço, exceto nas hipóteses expressamente previstas na legislação do Imposto sobre Produtos Industrializados ou do Imposto de Circulação de Mercadorias e de Prestação de Serviços”.

 

26. Nessa linha, não há previsão para emissão de documento fiscal para simples faturamento, salvo disposição de lei em contrário (como, por exemplo, no caso de operação de venda para entrega futura disposta no artigo 129, §1º, do RICMS/2000, ou dos pagamentos parcelados previstos em contrato, de acordo com o artigo 126 do mesmo Regulamento). A operação aqui analisada, portanto, não representa hipótese de emissão de nota para simples faturamento.

 

27. Ao contrário, a Nota Fiscal de venda deve ser normalmente emitida antes de iniciada a saída da mercadoria, conforme artigo 125, inciso I, do RICMS/2000, com o devido destaque do ICMS e indicação do CFOP correspondente, tendo em vista tal operação estar inserida no campo de incidência do imposto estadual.

 

28. Consideramos, assim, respondidas as indagações da Consulente.

 

A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.

Comentário

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