RC 28393/2023
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30/11/2023 04:00

RESPOSTA À CONSULTA TRIBUTÁRIA 28393/2023, de 27 de novembro de 2023.

Publicada no Diário Eletrônico em 29/11/2023

Ementa

ICMS – Substituição tributária – Operações com água mineral envasada – Industrialização por encomenda – Predominância dos insumos e materiais empregados – Tratamento tributário.

I. Não é aplicável a disciplina da industrialização por conta de terceiro às operações em que o estabelecimento contratado utiliza matéria-prima predominantemente própria (nesse caso, água mineral), configurando-se industrialização por encomenda.

II. A retenção antecipada do imposto, por substituição tributária, deve ser integralmente efetuada pelo estabelecimento fabricante paulista que efetua o envase de água mineral, ainda que por encomenda de outra empresa.

III. Na Nota Fiscal emitida pelo estabelecimento fabricante, na saída da água mineral envasada com destino ao encomendante, deve ser utilizado o CFOP 5.401 – “Venda de produção do estabelecimento em operação com produto sujeito ao regime de substituição tributária”, e o valor da operação deve corresponder à somatória das mercadorias (garrafa, tampa, rótulo e água mineral).

Relato

1. A Consulente, que tem como atividade econômica principal declarada no Cadastro de Contribuintes do Estado de São Paulo – CADESP a “fabricação de refrigerantes” (CNAE 11.22-4/01) e, como atividade secundária, dentre outras, a “fabricação de águas envasadas” (CNAE 11.21-6/00), informa que presta serviços de industrialização para terceiros, incluindo o envasamento de água mineral, para contribuintes do Estado de São Paulo e de outros Estados.

2. Acrescenta que tem um potencial cliente, situado neste Estado, que deseja contratar a Consulente para envasar água mineral utilizando a disciplina de industrialização por conta de terceiros, prevista no artigo 402 e seguintes do RICMS/2000. Para tanto, a consulente manteria dois contratos comerciais, segregados e independentes: (i) um de venda “a granel” da água mineral, em volume expressivo, com emissão de nota fiscal de venda, com a tributação normal do ICMS próprio, utilizando-se do CFOP 5.122 (venda de produção do estabelecimento remetida para industrialização, por conta e ordem do adquirente, sem transitar pelo estabelecimento do adquirente); e separadamente, (ii) um segundo contrato, de prestação de serviço de industrialização/envasamento do produto. Para este, concomitantemente com a venda, também receberia a nota fiscal de remessa simbólica dessa matéria-prima, bem como a remessa efetiva das embalagens e rótulos dos recipientes para o envase, nos termos do inciso II do artigo 406, do RICMS. Seguindo o procedimento normativo, por ocasião da conclusão do processo industrial, a Consulente declara que emitiria a Nota Fiscal prevista no inciso III, do artigo 406, do RICMS, considerando, ainda, o diferimento do ICMS sobre os serviços prestados, nos termos da Portaria CAT 22/2007.

3. Desse modo, questiona se está correta sua interpretação de que o processo industrial descrito no item anterior, com operações comerciais distintas e segregadas de venda de matéria-prima e industrialização, atende às normas contidas no artigo 402 e seguintes do RICMS/2000, bem como na Portaria CAT 22/2007, caracterizando-se como industrialização por conta de terceiros.

Interpretação

4. Preliminarmente, conforme artigo 293 do RICMS/2000 combinado com o Anexo III da Portaria CAT 68/2019, cabe destacar que a água mineral envasada, classificada na posição 22.01 da Nomenclatura Comum do Mercosul - NCM, está sujeita ao regime de substituição tributária.

5. Posto isso, passamos a tecer alguns comentários sobre industrialização por encomenda. Ressalte-se que não é toda industrialização por encomenda que pode ser classificada como uma industrialização por conta de terceiro, sendo esta uma espécie daquele gênero. Desse modo, tendo o instituto da industrialização por conta de terceiro uma abrangência mais restrita, não é toda e qualquer industrialização por encomenda que pode se valer da disciplina legal dos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000.

6. Com efeito, na acepção clássica do instituto da industrialização por conta de terceiro, visualizou-se a situação em que o autor da encomenda fornece todas - ou, senão, ao menos, as principais - matérias-primas empregadas na industrialização, enquanto ao industrializador cabe o fornecimento essencialmente da mão de obra, apenas com eventual acréscimo de alguma matéria-prima secundária. E essa é a hipótese normatizada pelos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000.

7. Sendo assim, no instituto da industrialização por conta de terceiro, criou-se uma ficção legal, aproximando-se o autor da encomenda da industrialização e tratando-o como industrializador legal para fins do ICMS, de modo que tudo se passa como se a industrialização fosse feita pelo próprio autor da encomenda, isto é, como se ele adquirisse as mercadorias empregadas no processo de industrialização e se creditasse do respectivo imposto. Dessa forma, essa sistemática pressupõe a remessa, pelo autor da encomenda, se não de todos os insumos, de parcela substancial, cabendo ao industrializador a aplicação de mão de obra e, eventualmente, de outros materiais secundários.

8. Diferentemente, nos casos de industrialização por encomenda, em que o industrializador fornece as matérias-primas substanciais a serem aplicadas na industrialização, sem intermédio do autor da encomenda, não há que se falar na sistemática dos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000, recaindo-se nas regras ordinárias do ICMS.

9. Portanto, conforme entendimento consolidado desta Consultoria Tributária, expresso nas Respostas à Consulta 3494/2014, 6324/2015 e 11726/2016 (disponíveis em https://legislacao.fazenda.sp.gov.br/Paginas/Home.aspx), o simples envio de insumos acessórios, a exemplo do material de embalagem, do encomendante para o estabelecimento industrializador, não é condição suficiente para configurar a operação como de industrialização por conta de terceiro, já que esse simples feito não pode desvirtuar o instituto, invertendo-se, assim, o polo passivo responsável pelo adimplemento da obrigação tributária. Isso é, no caso em que o industrializador fornece todos ou parte substancial dos insumos a serem utilizados em seu processo industrial, o realiza por conta própria, a circunstância de receber do encomendante insumos secundários, ainda que envoltos ao processo industrial, não transmuda a operação para uma industrialização por conta de terceiro.

10. Neste contexto, deve-se dizer que, tomando-se por base as informações apresentadas, no entendimento deste Órgão Consultivo, a contratação da industrialização em separado da aquisição da água mineral tem característica meramente formal, já que essa venda existe única e exclusivamente em função da operação de industrialização subsequente. Então, em que pese a autonomia da vontade e a livre iniciativa, cabe aos particulares, no exercício regular de suas atividades, zelar pela lisura das práticas negociais, sob a observância da boa-fé e da função social do contrato. Assim, não podem os contribuintes se valer da utilização formal de negócios jurídicos estruturados apenas no intuito de obter um regime tributário mais favorável.

11. Com relação ao presente caso são valorosos os ensinamentos de Marco Aurélio Greco (Planejamento Tributário: Nem Tanto ao Mar Nem Tanto à Terra. In: ROCHA, Valdir de Oliveira (Coord.). Grandes Questões Atuais do Direito Tributário: 10º Volume. São Paulo: Dialética, 2006. p. 328-329), no sentido de ser necessária a verificação das razões que ensejam a eleição de determinada estrutura de negócio, por parte do contribuinte, para que se considere seus devidos efeitos tributários, como se verifica em análise do trecho abaixo:

“As manifestações de vontade não existem isoladas no tempo e no espaço. Surgem em função de uma situação que as antecede e busca-se com elas obter determinado resultado. Assim, o relevante em determinada operação (além do atendimento à legalidade e da inocorrência de patologias) é a justificação que se encontra em seu contexto, o que abrange:

I) a existência de motivo e finalidade não predominantemente tributários;

II) a congruência da manifestação de vontade (e do perfil do negócio) em relação ao motivo e à finalidade; e

III) a função - dentro do empreendimento econômico - a que se destina a operação.

Portanto, o essencial não é singelamente existir menor carga tributária, como efeito de certo negócio, mas examinar a justificação da conduta que teve aquele efeito tributário.

Questionável é a obtenção da menor carga sem justificativa que não essa busca (a redução pela redução), geralmente acompanhada da invocação veemente de uma liberdade absoluta e de uma liberdade individual levada às alturas que ignora (ou pior, desconsidera) a inserção global em que a ação se desenvolve.”

12. Como se verifica, há posicionamento doutrinário no sentido de que a adoção de modelos negociais sem finalidade clara que justifique a forma como foram estruturados, além do simples gozo de tributação mais vantajosa, revela-se viciada, devendo-se inferir o real propósito desejado pelas partes envolvidas para que se defina o apropriado tratamento tributário aplicável.

13. Sob essa ótica, recorda-se que os tributos não incidem sobre as disposições contratuais em si, tal como acordado pelas partes, mas sim sobre o fato econômico subjacente. Sendo os contratos meras qualificações jurídicas do fato dadas pelas partes, essa qualificação pode se mostrar precária em relação a terceiros, especialmente em relação ao Fisco, sobretudo quando o fato econômico subjacente não corresponder à qualificação contratual dada pelas partes. Assim, ao procedimento fiscalizatório, cabe a persecução da verdade material subjacente às disposições privadas, isto é, cabe ao Fisco a persecução dos fatos jurídicos que efetivamente tenham ocorrido in concreto. E, em decorrência disso, o parágrafo único do artigo 116 do Código Tributário Nacional, permite a desconsideração dos atos e negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária.

14. Desse modo, a situação exposta pela Consulente não se configura como industrialização por conta de terceiro, posto que a industrialização é efetuada com matéria-prima predominantemente fornecida pelo industrializador, ainda que com dois contratos separados, não se subsumindo ao tratamento tributário previsto para este regime, nos artigos 402 e seguintes do RICMS/2000 e na Portaria CAT-22/2007. Sendo assim, o cliente da Consulente é, para fins tributários, considerado comerciante e não fabricante de água mineral.

15. Não sendo aplicáveis as regras de industrialização por conta de terceiro, as saídas de mercadorias serão regularmente tributadas, podendo os agentes envolvidos se aproveitarem do crédito do imposto, desde que respeitadas as regras estabelecidas nos artigos 61 e seguintes do mesmo Regulamento. Assim, nas saídas internas da água mineral envasada do estabelecimento da Consulente com destino ao encomendante deve ser utilizado o CFOP 5.401 (venda de produção do estabelecimento em operação com produto sujeito ao regime de substituição tributária) e não os CFOPs relativos ao retorno de mercadoria utilizada na industrialização.

16. Quanto à substituição tributária, informamos que a Consulente, estabelecimento fabricante localizado no território paulista, na saída das mercadorias arroladas no artigo 293 do RICMS/2000, com destino ao estabelecimento do encomendante, é a responsável pela retenção e pelo pagamento do imposto incidente nas saídas subsequentes, nos termos do inciso I do referido dispositivo regulamentar.

17. No que se refere aos CFOPs a serem utilizados nas operações de industrialização por encomenda, informamos que o encomendante deverá utilizar o CFOP 5.949 e informar no documento fiscal tratar-se de “remessa de garrafa, tampa e rótulo para envase de água mineral em estabelecimento de terceiro” e efetuar o destaque do imposto devido. Na saída do estabelecimento da Consulente, como já informado no item 15 desta resposta, o CFOP a ser utilizado é o 5.401 e o valor da operação deve corresponder à somatória das mercadorias (garrafa, tampa, rótulo e água mineral).

18. Por fim, para as operações com água mineral e natural, atualmente, há a Portaria SRE 40/2023 que divulga os valores atualizados para fins de de terminação da base de cálculo da substituição tributária de bebidas alcoólicas, refrigerantes, águas e outras bebidas, sendo que a retenção antecipada do imposto, por substituição tributária, deve ser integralmente efetuada pelo estabelecimento envasador paulista de água mineral (Consulente).

19. Diante do exposto, consideramos respondidos os questionamentos apresentados pela Consulente.

A Resposta à Consulta Tributária aproveita ao consulente nos termos da legislação vigente. Deve-se atentar para eventuais alterações da legislação tributária.

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